Muitos discutem se Bernard Herrmann foi o maior compositor de cinema que já existiu. Mas é indiscutível que Herrmann, graças ao seu legado em termos de estrutura musical, uso de instrumentação inovadora e estilo de composição, teve grande influência no modo como os filmes passaram a ser musicados, e conquistou seu lugar ao lado de Miklos Rozsa, Erich Wolfgang Korngold, Franz Waxman, Alfred Newman e Max Steiner na galeria dos compositores da Era de Ouro de Hollywood.
Nascido em Nova York no dia 29 de junho de 1911, Herrmann foi um prodígio que iniciou a compor ainda adolescente, e aos 20 anos de idade formou uma orquestra. A sua amizade com o então apenas promissor diretor Orson Welles levou-o a compor para muitos dos programas de rádio de Welles, e principalmente ao seu primeiro score cinematográfico em 1941 - CITIZEN KANE. Nos trinta anos que se seguiram, Herrmann compôs algumas das mais inovadores e marcantes trilhas que o cinema conheceu. A filmografia de Herrmann contém tantas obras-primas que é difícil destacar alguma: THE MAGNIFICENT AMBERSONS, THE GHOST AND MRS. MUIR, THE WRONG MAN, VERTIGO, NORTH BY NORTHWEST, PSYCHO, CAPE FEAR...
Em contraste ao estilo que prevalecia em Hollywood, as trilhas de Herrmann, ao invés de luxuriantes arranjos para toda a orquestra, possuíam orquestrações incomuns, normalmente dando ênfase a uma categoria específica de instrumentos. É o caso da música de PSICOSE (1960), composta exclusivamente para cordas. Igualmente inovativo foi o uso de temas breves e facilmente reconhecíveis, ao invés de melodias mais longas. Herrmann conquistou o Oscar em 1941 por THE DEVIL AND DANIEL WEBSTER, sendo também indicado por CIDADÃO KANE (1941), ANA E O REI DO SIÃO (1946), TAXI DRIVER (1976) e OBSESSÃO. Apesar de Herrmann ter sido um sujeito difícil e irascível, ao longo de sua carreira manteve com sucesso algumas parcerias com diretores e produtores. De fato, o compositor é lembrado pelo cinéfilo principalmente por sua colaboração com o mestre do suspense, Alfred Hitchcock. Dentre as muitas trilhas para Hitchcock, destacam-se O HOMEM QUE SABIA DEMAIS (1956) - no qual aparece conduzindo uma orquestra - UM CORPO QUE CAI (1958) e o já citado PSICOSE (1960).
Tão importante quanto a colaboração com Hitchcock foi a obra de Herrmann dedicada ao cinema fantástico. Filmes como SIMBAD E A PRINCESA (1958), AS VIAGENS DE GULLIVER (1960), A ILHA MISTERIOSA (1961) e JASÃO E O VELO DE OURO (1963), em parceria com o mestre dos efeitos especiais Ray Harryhausen, tiveram suas cenas filmadas quadro-a-quadro engrandecidas pela música enérgica e criativa do compositor. Como nenhum outro de seus colegas, "Benny" (como seus amigos o chamavam) conseguia não apenas criar melodias para acompanhar as imagens de um filme, mas também transportar essas imagens para a música, elevando-a para uma nova dimensão de impacto. A gravação estéreo original de VIAGEM AO CENTRO DA TERRA (VSD-5849), que graças à Varèse está disponível na íntegra pela primeira vez, é um exemplo marcante. Em suas orquestrações graves e majestosas, sem qualquer tipo de cordas e com o uso de vibrafone, metais, cinco órgãos e harpas, a música é o verdadeiro cenário do filme. Nela podemos visualizar as cavernas gigantescas, os monstros pré-históricos, a cidade perdida de Atlântida, as explosões vulcânicas. É curioso notar que as românticas canções interpretadas por Pat Boone, compostas por James Van Heusen e Sammy Cahn, incluídas no CD, destoam totalmente dos sons sinistros fornecidos por Herrmann.
A partir de 1993, uma série de relançamentos e regravações em CD trouxeram a obra de Herrmann para toda uma nova geração de apreciadores de trilhas sonoras. Destaca-se na Fox Classic Series O DIA EM QUE A TERRA PAROU (1951), com a gravação original remasterizada em estéreo. A London relançou várias suítes de obras conduzidas pelo compositor nos anos 60 e 70, e a Marco Polo produziu uma nova gravação de JANE EYRE (1944), à qual seguiu-se GARDEN OF EVIL (1954). A Rhino lançou a primeira versão integral da trilha de INTRIGA INTERNACIONAL (1959), mas sem dúvida o mérito maior fica com a tradicional gravadora Varèse Sarabande, que ao lado de outros títulos de Herrmann em catálogo, adicionou regravações conduzidas por Joel McNeely de FAHRENHEIT 451, VERTIGO (além da versão expandida da gravação original), THE TROUBLE WITH HARRY e PSYCHO. A Varèse também retomou a série clássica da Fox com JORNADA AO CENTRO DA TERRA (1959) e THE GHOST AND MRS. MUIR. Na nova edição de PSICOSE, de um modo geral, o condutor conseguiu recriar o ritmo e o tempo da música de Herrmann, porém haverá quem ainda prefira a versão que o próprio autor regravou em 1975, conduzindo a National Philarmonic Orchestra, ou até mesmo a excelente adaptação que Danny Elfman fez da trilha para a controvertida refilmagem de 1998. O CD de McNeely, contudo, possui alguns bônus - uma versão alternativa da sequência pós-assassinato, e mais importante, o tratamento original de Herrmann para a faixa "Discovery". No filme, Hitchcock preferiu repetir os violinos do assassinato do chuveiro na cena em que Vera Miles descobre o cadáver embalsamado da mãe de Norman Bates (Anthony Perkins). A série de McNeely prossegue com CITIZEN KANE e a trilha rejeitada por Hitchcock para CORTINA RASGADA, o que findou a relação de amizade de Herrmann e Hitchcock.
Entre as recentes regravações de obras de Herrmann, ainda citamos THE 7th VOYAGE OF SINBAD, conduzida por John Debney, a primeira versão completa em CD de JASON AND THE ARGONAUTS, conduzida por Bruce Broughton, e O EGÍPCIO, composta em parceria com o grande Alfred Newman. Bernard Herrmann morreu em 23 de dezembro de 1975, algumas horas após encerrar as gravações de TAXI DRIVER, de Martin Scorcese, trilha relançada em 1998 pela Artista em uma estupenda e completa edição. Scorcese, aliás, era um grande fã do compositor, a quem teve a oportunidade de homenagear quando refilmou CABO DO MEDO (CAPE FEAR, 1991): reutilizou a trilha do filme original composta por Herrmann, adaptada por Elmer Bernstein, juntamente com trechos do score não utilizado em CORTINA RASGADA.
FILMOGRAFIA DE HERRMANN
OSCARS DE HERRMANN
1976 - Indicado, Melhor Partitura Original - Taxi Driver
1976 - Indicado, Melhor Partitura Original - Obsession
1946 - Indicado, Melhor Partitura Original para Drama ou Comédia - Anna and the King of Siam
1941 - Indicado, Melhor Partitura Original para Drama - Citizen Kane
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